Ana Catarina Serras
Finance and Sustainability Senior Advisor
O Mercado de Capitais e a Bolsa de Valores são tópicos correntes, recorrentes e de tendência em Angola nos últimos meses. Concentram a atenção dos diversos players, são temas de início de reuniões, formações e workshops. Dominam a temática dos eventos, da televisão e até de debates na rádio.
O desenvolvimento do mercado de capitais, da Bolsa de Valores e das dinâmicas associadas a estas matérias em Angola, tem tanto de crítico como de desafiante. Neste artigo procuramos de forma simplificada, apresentar razões pelas quais a Bolsa de Valores e um mercado de capitais mais desenvolvido é relevante e, porque é relevante, também, para as PMEs.
Bolsa de Valores: o que é e qual o propósito?
De forma simplista, é um mercado organizado onde são realizadas negociações de compra e venda de ativos financeiros, como acções, obrigações, títulos e outros instrumentos financeiros. A forma como as empresas entram e se registam neste mercado é regulada, tem requisitos apertados, e a compra e venda de títulos é centralizada e trabalhada por entidades, também elas, sujeitas a regulação. A estrutura da Bolsa de Valores, do mercado financeiro, da regulamentação do mercado e dos activos financeiros que nela se trocam, tem directamente a ver com as características intrínsecas do mercado em que está e com as opções que estão na base da sua criação.
Ainda de forma genérica, a Bolsa de Valores tem como propósitos principais facilitar a captação de recursos financeiros, promover a liquidez dos activos e a transparência do mercado – preços e informação, oferecer oportunidade de investimento e, em mercados mais desenvolvidos, promover até a mitigação de riscos de flutuações de activos.
Qual a relevância da Bolsa de Valores para o mercado?
A relevância da sua existência, está directamente relacionada com o fomento dos propósitos-base mencionados anteriormente de forma simplificada, existindo ainda uma razão subjacente a todo o processo de criação e activação da Bolsa de Valores, que se prende com a necessária estruturação, dinamização e desenvolvimento do mercado financeiro e das empresas.
A criação de uma Bolsa de Valores e a sua dinamização, exige e envolve em si, uma obrigatória reflexão sobre o mercado financeiro, o reforço e redefinição das instituições intervenientes e de supervisão, o desenvolvimento e promoção da regulação, reorganização do mercado financeiro, enquanto obriga em paralelo, a uma avaliação das melhores práticas internacionais e das características específicas do tecido empresarial do país.
Mais, a criação de uma Bolsa de Valores com activos financeiros diversificados, tem ainda um efeito de catalisador do mercado financeiro, uma vez que provoca/ concorre com a dinâmica de investimentos financeiros instalada, potencia formas e destinos alternativos para os investimentos, e fomenta o aumento da rentabilidade de investimentos, enquanto introduz novos instrumentos e players no mercado.
A relevância para as empresas com dimensão
A relevância da Bolsa de Valores para as grandes empresas (de todos os sectores) é incontornável, assenta essencialmente na capacidade de aceder a uma dimensão de recursos financeiros que de outra forma não seria possível, e/ou de demonstrar a liquidez do seu valor enquanto empresa.
A relevância para as empresas com dimensão, vai contudo, muito para além destas duas matérias tradicionais, e recorrentemente discutidas. A relevância de conseguir cotar e manter cotada uma empresa em Bolsa, ainda mais em mercados emergentes como é Angola, e numa economia carente de empresas de referência, reveste um carácter muito mais marcante e disruptivo. É por si só, uma demonstração de resiliência, capacidade e competência das empresas e das suas equipas, e potencia o reconhecimento e notoriedade da empresa muito para além do território nacional. Mais, fomenta a transparência e confiança no mercado, constrói referências e promove a partilha de informação e boas práticas.
A relevância da Bolsa de Valores para as PMEs
Para as PMEs, ao contrário das empresas de maior dimensão, a relevância não se prende com o acesso a recursos financeiros e/ou demonstração de liquidez do seu valor enquanto empresa. É necessário assumir que a maioria das PMEs não reúne condições para conseguir cumprir requisitos para uma abertura de capital em Bolsa de Valores, e na maioria dos casos, tem desafios a ultrapassar relacionados com a sua solidez e modelo de negócio, organização e estruturação interna, objectivos e planeamento estratégico, governação e controlo financeiro prioritários e críticos para a sua continuidade de negócio. A relevância da Bolsa de Valores para as PMEs, especialmente num mercado como o de Angola, resulta essencialmente de três vectores principais:
- existência e capacidade de identificação de empresas nacionais de referência, e a construções de referenciais nacionais e de boas práticas nos diversos sectores;
- fomento da disponibilidade de informação, da transparência e confiança no mercado;
- acesso a instrumentos financeiros alternativos que se constituem como uma fonte alternativa de rentabilidade dos capitais gerados nas operações.
Conclusão
Como nota de conclusão, reforçamos que a criação de uma Bolsa de Valores e a construção de um plano para que a mesma se torne viável, relevante e concretize, em cada dia, o seu propósito, é um caminho que se faz percorrendo passo atrás de passo, ao ritmo do país, da regulação, das políticas e das empresas. A Bolsa de Valores é tanto uma referência, quanto é um reflexo do país, da sua economia, das suas empresas e dos seus intervenientes.
Para as empresas, sejam estas de grande dimensão ou PMEs, importa reter que nem todas estão preparadas e devem ponderar cotar-se em Bolsa. Todas as empresas devem, contudo, fazer o seu processo de reflexão, análise e diagnóstico, utilizar as referências disponíveis para se desenvolverem, e aproveitarem as oportunidades que a abertura de capital vai apresentando para os seus negócios e capitais.
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